
A rua dos Latoeiros
(atual Gonçalves Dias) está entre as mais importantes da história do Brasil desde o final do século XVIII. O reconhecimento não se deu apenas pelo comércio ali instalado, mas pelos fatos políticos que a marcaram. Em 1789, Joaquim José da Silva Xavier (conhecido como Tiradentes, herói da independência política do Brasil) estava na casa do torneiro Domingos Fernandes da Cruz, residente dessa rua, quando foi preso por patrulhas do Regimento de Extremoz, comandadas por Francisco Vidigal. Apesar do acontecimento que ficou para a posteridade, o nome da rua se deve à atividade profissional dos artesãos especializados em trabalhos com cobre e latão que ali estabeleceram seus negócios. Eles residiram e trabalharam na via por mais de um século a partir de meados dos anos 1700. A mudança de nome para Gonçalves Dias ocorreu apenas em 1865, em homenagem ao poeta morto no naufrágio do Ville Boulogne, autor da célere obra “Os Timbiras” (1857), escrita em uma das casas da região.
No início do novecentismo, a Gonçalves Dias estava entre as mais desenvolvidas do ponto de vista comercial, apresentando grande variedade de empresas. Para Brasil Gerson, a via se equiparava à Ouvidor pelos proeminentes negócios que possuía desde o final do século XIX. Durante muitos anos, foi conhecida como rua dos Latoeiros até que, em 1865, teve seu nome alterado em honra ao poeta romântico maranhense. Dada sua importância, a primeira linha de bondes instaurada pela Botanical Garden Rail Company (1868) partia exatamente de sua esquina com a Ouvidor. Nos últimos anos do oitocentismo muitas empresas de ramos variados estavam instaladas nessa área tais como o salão de beleza Schimidt, pertencente ao cabeleireiro das damas da corte nos últimos anos do império, o Jornal do Brasil (1891), comandado pelo monarquista Rodolfo Dantas, filho do senador Dantas e a Confeitaria Colombo, fundada em 1894 pelos imigrantes portugueses Joaquim Borges de Meireles e Manuel José Lebrão. A Colombo trouxe muita sofisticação ao local, não apenas pela qualidade de seus serviços e produtos, mas também pelos detalhes arquitetônicos de seu prédio. As bancadas de mármore, os espelhos de cristal e os ornamentos esculpidos em jacarandá por Antonio Borsoi se tornaram emblemas da Belle Époque carioca, atraindo até hoje turistas e residentes do Rio de Janeiro. Nas imediações da doceria funcionavam ainda a sorveteria casa Dô, a farmácia homeopática de Teixeira Novaes, um cabaré ao estilo parisiense intitulado Palácio de Cristal e um centro comercial de plantas. O mercado das Flores ainda não tinha a aparência dos dias de hoje, aproximando-se mais de uma feira livre. Seu primeiro edifício foi construído pelos políticos Carlos Sampaio e Epitácio Pessoa sendo, mais tarde, reconfigurado por Sérgio Bernardes, na gestão de Carlos Lacerda. No começo dos anos 1900, a região conservava algumas práticas comerciais curiosas, como a loja de Fanny Arion, especializada na venda de sanguessugas para fins medicinais. Logo, se algumas casas comerciais estavam afinadas com os hábitos culturais mais modernos, outras conservavam costumes seculares. Por sua relevância histórica, a Gonçalves Dias não teve sua estrutura transformada pelas obras do início do século XX.
Referências:
GERSON, 2015, p.103
MORALES DE LOS RIOS, 2000, p.361
GERSON, 2015, p. 114 e p. 115